Sugestões de Livros

Caros investidores,

Dando continuidade à nossa iniciativa do ano passado, reservamos nossa última carta do ano para sugerir cinco livros relacionados à temática de investimentos. Como critério, buscamos priorizar livros que gostamos bastante, mas talvez não sejam tão conhecidos do público.

“An investment in knowledge pays the best interest.” – Benjamin Franklin

  • More Than You Know: Finding Financial Wisdom in Unconventional Places
  • Publicado pela primeira vez em 2008, este livro ganhou vários prêmios e foi reconhecido pela Porchlight como um dos 100 melhores livros de negócios de todos os tempos.

    De uma certa forma, é um percursor na aplicação de ciências comportamentais no negócio de investimentos, algo que ficou muito mais popular na última década principalmente após a publicação de Thinking Fast and Slow em 2011. Ao invés de desenvolver um tema ou uma tese de forma prescritiva, o livro é estruturado ao redor de uma coletânea de 50 artigos, que podem ser lidos de maneira independente, com algumas ideias provocativas e insights das teorias mais atuais na época da publicação, como por exemplo:

      • Os investidores tendem a assumir linearidade em suas projeções sobre negócios, enquanto, na verdade, o crescimento de uma empresa tende a seguir uma curva em S. Isso significa que as pessoas subestimam o potencial de crescimento das empresas de rápido crescimento, e superestimam o crescimento à medida que os negócios amadurecem.
      • Os modelos financeiros que implicam um preço exato para uma ação são menos úteis do que os modelos que calculam o valor do negócio em vários cenários, e atribuem probabilidades a cada cenário. Uma sugestão que o autor faz é ter um analista desenvolvendo um modelo econômico-financeiro para a empresa e, em seguida, ter um segundo analista atribuindo probabilidades para cada cenário, aproximando-se de um método científico duplo-cego.
      • Estudos indicam que um grupo de pessoas sem nenhum conhecimento específico pode resolver problemas tão bem quanto indivíduos que sejam especialistas no tema.

      • Ser paciente e diligente e seguir um processo de investimento sólido é mais importante do que esporadicamente apresentar ótimos resultados de investimento. Um bom resultado não justifica um processo ruim. Mas mesmo que um bom processo possa às vezes produzir um resultado ruim, no longo prazo ele superará um processo ruim. Embora para alguns isto pareça óbvio, a verdade é que a maior parte dos investidores em fundos presta muito pouca atenção à robustez do processo de investimento.

    De tempos em tempos é interessante revisitar algumas destas ideias, até porque elas não deixam de ser verdade simplesmente por saírem ‘da mídia’. Um exemplo é o Kelly Criterion, muito bem aplicado na gestão de investimentos por Edward Thorpe (vide sugestões de livros do ano passado) e que, embora seja uma teoria desenvolvida na década de 50, até hoje é pouco ensinada.

    O autor de “More than you know”, Michael Mauboussin, traz em seu currículo uma mistura interessante de academia e prática de investimentos. Atualmente lidera a área de pesquisa do fundo de ações de longo prazo da Morgan Stanley Counterpoint Global, e é professor adjunto de finanças na Columbia Business School em Nova Iorque.

    É uma leitura rápida e bastante provocativa sobre temas de investimento, tanto para iniciantes quanto para profissionais da área.

      1. The Quest: Energy, Security, and the Remaking of the Modern World

    Título em português: A Busca: energia, segurança e a reconstrução do mundo moderno.

    Nestes tempos em que o litro da gasolina está custando mais de R$ 7,00 em muitos estados, a leitura deste livro torna-se obrigatória para compreendermos a dinâmica econômica e geopolítica dos mercados de energia.

    Escrito por uma das maiores autoridades no assunto, Daniel Yergin, este livro pode ser considerado uma continuação da publicação de 1992, “The Prize”, no qual narra a história do petróleo entre 1850 e 1990.

    “The Quest” inicia contando como evoluiu a indústria do petróleo a partir da primeira Guerra do Golfo, descrevendo sua trajetória até a dissolução da União Soviética em mais de uma dúzia de repúblicas. Mas o livro vai além da indústria petrolífera, trazendo uma visão abrangente do mercado global de energia e suas interdependências geográficas, políticas e tecnológicas.

    Para dar contexto do ambiente político que permeia esta indústria, o livro debate as questões relativas ao tema segurança energética dos países e o desafio de se ter acesso a fontes confiáveis e economicamente viáveis de energia para suportar seu crescimento. Além disso, traz bastante detalhes sobre a China, que foi o fiel da balança nas últimas décadas.

    A importância da eletricidade para o mundo atual ganha uma sessão específica no livro. A história do desenvolvimento desta forma ubíqua de energia já foi narrada várias vezes, mas Daniel o faz de maneira sucinta e com maestria, discutindo também os desafios de se manter um sistema tão abrangente e complexo operando 24/7 sem interrupções. Cabe aqui uma explanação sobre a energia nuclear, que demorou para ganhar confiança como fonte de geração elétrica após os bombardeios americanos no Japão na Segunda Guerra mundial. Durante a década de 70 teve seus dias de glória, mas acabou caindo em desgraça em função de acidentes como os de Chernobyl e Fukushima. Com este contexto, por exemplo, conseguimos entender melhor a razão que o tema voltou à tona e levou a China a anunciar no início de novembro um investimento de US$ 440 bilhões em novos reatores nucleares até 2030.

    Outro tema bastante atual para o qual o “The Quest” nos dá um excelente contexto é sobre o de mercado de carbono. Celebrado durante a última COP 26 em Glasgow, este acordo global tem como objetivo a redução da utilização dos combustíveis fósseis através do mecanismo conhecido como “cap and trade”.

    Numa sessão específica, o livro cobre a história da ciência climática, a evolução dos debates sobre o aquecimento global e como a introdução de um mercado de cap-and-trade reduziu de maneira significativa as emissões de gases contendo SO2, o principal responsável pela chuva ácida.

    Vale mencionar, por fim, a discussão sobre o futuro do mercado automobilístico e a potencial adoção do carro elétrico. Na época da publicação do livro, a Tesla tinha acabado de fazer seu IPO, a primeira empresa do setor automotivo a abrir seu capital deste a Ford em 1946!

    Yergin possui uma escrita bastante fluída, tornando muito prazerosa a leitura de suas mais de 800 páginas.

      1. The Psychology of Money: Timeless lessons on wealth, greed, and happiness

    Título em português: A psicologia financeira: lições atemporais sobre fortuna, ganância e felicidade.

    Este é um dos melhores livros sobre finanças pessoais que lemos recentemente. Muito bem escrito, oferece um conteúdo profundo e de alta qualidade de uma maneira simples e objetiva.

    Ao contrário de muitos outros livros do gênero, “Psychology of Money” não tenta apresentar táticas ou fórmulas específicas para a construção rápida de um patrimônio. Morgan Housel, seu autor, utiliza o exemplo de 19 histórias de como pessoas lidaram com seu dinheiro para investigar os modelos mentais e os comportamentos que moldam grande parte do nosso sucesso financeiro.

    A premissa que permeia o livro é que ganhar dinheiro tem pouco a ver com o quão inteligente você é, mas muito a ver com como você se comporta. Uma pessoa que seja um gênio, mas que perde controle emocional facilmente, pode ser um desastre financeiro (vide próxima resenha para um exemplo histórico!). Por outro lado, o oposto também é verdade. Pessoas comuns, sem nenhuma educação financeira, podem se tornar ricas se desenvolverem habilidades comportamentais que não têm nada a ver com medidas formais de inteligência.

      • Menos ego, mais riqueza: nossa capacidade de economizar dinheiro é a diferença entre o nosso ego e nossa renda. A maior parte de nossos gastos com coisas e bens (que alimentam nosso ego) atrapalha nossa liberdade financeira e opções futuras. “Gastar dinheiro para mostrar às pessoas quanto dinheiro você tem é a maneira mais rápida de ter menos dinheiro”
      • Horizonte de investimento mais longo implica em melhores retornos: parece simples, mas na prática é difícil de perseguir. As pessoas admiram a habilidade de investir de Warren Buffet, mas seu verdadeiro segredo é o tempo e a paciência – sua fortuna é o resultado de mais de 75 anos com seu patrimônio aplicado, e 99.6% de sua fortuna (de quase US$ 100 bilhões) foi adquirida após ele completar 52 anos!
      • Bons investimentos não significam, necessariamente, obter os maiores retornos, porque os maiores retornos tendem a ser sucessos pontuais que não podem ser repetidos. Trata-se de obter retornos muito bons que você pode manter e que podem ser repetidos por um longo período.
      • O maior valor intrínseco do dinheiro é sua capacidade de lhe dar controle sobre o seu tempo.
      • Uma “Estratégia Razoável’ é melhor do que a “Estratégia Racional”: Razoável é o que funciona para você. Assumir riscos indevidos para otimizar cada centavo de retorno pode não ser sustentável no longo prazo. Este é um ponto que aprofundamos na nossa carta anterior.
      1. Money for Nothing: The Scientists, Fraudsters, and Corrupt Politicians Who Reinvented Money, Panicked a Nation, and Made the World Rich

    A “South Sea Bubble”, um surto financeiro que ajudou a solidificar o capitalismo nascente em 1720, talvez não seja tão sexy e conhecida como a Mania das Tulipas que ocorreu em 1637. Não capturou a imaginação popular da mesma forma. No entanto, ao ajudar a inventar mercados de bonds (títulos de dívida) e a consolidar o poder de influência do setor financeiro na política moderna, deu início ao mercado de capitais da maneira que conhecemos hoje.

    No início do século XVIII, a Inglaterra estava ficando sem dinheiro devido a uma prolongada guerra com a França. O Parlamento tentou levantar fundos adicionais vendendo dívidas a seus cidadãos, recebendo dinheiro agora com a promessa de juros mais tarde. Foi a primeira dívida nacional permanente, mas ainda assim eles precisavam de mais.

    O Parlamento se voltou então para o mercado de ações – uma invenção relativamente nova em si – e onde as descobertas científicas de Isaac Newton (cálculo, movimento dos planetas), estava sendo tentativamente aplicadas.

    A South Sea Company (Companhia dos Mares do Sul), havia sido criada para explorar o monopólio do comércio entre Inglaterra e as colônias espanholas no Caribe. Havia um pequeno problema: Espanha e Inglaterra estavam em guerra (novamente), inviabilizando qualquer forma de negócio entre estes países.

    Enquanto esperavam que os tradicionais inimigos resolvessem suas diferenças, os executivos da South Sea Company elaboravam complexos planos de negócios, com base nas tabelas atuariais de Newton e Halley (astrônomo e descobridor do cometa que leva seu nome).

    Logo, a South Sea Company começou a ver suas ações subirem de preço, com base não em algo que eles estivessem fabricando ou vendendo, mas sim no valor putativo de seus planos futuros. Estimulados pelo “sucesso” do negócio, os diretores da empresa começaram a tomar empréstimos para comprar mais ações da South Sea, usando as próprias ações como garantia.

    Os preços das ações dobraram, dobraram de novo e depois dobraram mais uma vez, fazendo com que todos em Londres, desde Newton até o Príncipe de Gales, se envolvessem na mania financeira.

    Uma coisa que torna o livro realmente agradável é o contexto fornecido pelo autor. O primeiro terço do livro mostra o que estava acontecendo no pensamento e na observação científica, na teoria matemática e na prática monetária entre meados e o final do século XVII. Sem essas mudanças, e a dívida nacional prevalecente, é difícil compreender como a bolha poderia ter acontecido no momento em que aconteceu.

    Uma segunda característica do livro é que ele explica claramente muitos dos conceitos básicos necessários para entender como a bolha começou e como foi deliberadamente inflada.

    Como curiosidade, este foi o desempenho (aproximado) de Isaac Newton, talvez uma das pessoas mais inteligentes que já viveu, com este investimento:

    Fonte: Marc Faber, Jeremy Grantham, Sir Isaac Newton

      1. Invent and Wander: The Collected Writings of Jeff Bezos, With an Introduction by Walter Isaacson

    O livro é baseado nas cartas aos acionistas da Amazon escritas por Bezos e em seus discursos realizados ao longo de sua vida. Em um tom determinado, Bezos comenta sobre os valores e a cultura que desenvolveu dentro da Amazon e que leva consigo em sua vida e seus outros negócios, como o Washington Post e a Blue Origin.

    As cartas aos acionistas vão muito além de comentar o resultado anual da empresa, trazendo um exemplo de estratégia corporativa, pensamento de longo prazo e obsessão pelo cliente. No nosso papel de investidores, lemos muitos relatórios anuais e cartas de executivos, porém dificilmente encontramos tamanha clareza e objetividade como as de Bezos.

    Uma coisa é um empresário bem-sucedido escrever sobre sua trajetória pós fato. A narrativa fica muito mais linear, e muitos desafios ou até fatores de sorte acabam sendo esquecidos ou perdendo seu devido peso. Outra coisa é ler a “história sendo escrita”. Por exemplo, este é o gráfico com preço das ações da Amazon ao redor do ano 2000:

    Fonte: Capital IQ

    E o que ele escreveu na carta anual de 2000? “Ouch. Que ano brutal para o mercado de capitais e especialmente para a Amazon. Na data dessa carta, a ação da Amazon está caindo mais de 80% desde a última publicação. […] Mas, se a companhia está melhor posicionada hoje do que estava um ano atrás, por que então o preço da ação caiu tanto? Como o famoso value investor Benjamin Graham falou, “no curto prazo, as ações são como urnas, em que as mais populares se destacam; no longo prazo, são como balanças, em que as com mais substância prevalecem””. E o mais fascinante é que do momento em que Bezos escreveu a carta de 2000 até hoje, a ação multiplicou por mais de 300x!

    Dentro dos pontos desenvolvidos no livro, destacamos os seguintes:

      • Day 1 Mindset: desde o início da Amazon, foi mantida a mentalidade de se trabalhar como se sempre fosse o primeiro dia, aquela motivação de realizar um projeto novo e com a energia e espírito empreendedor de participar de algo grandioso. Nós, como seres humanos, nos acomodamos de maneira muito rápida. A provocação do livro é encararmos todos os dias com aquela empolgação típica que temos ao iniciar um projeto pessoal novo.
      • It’s all about the long term: o curto prazo é muito volátil, isso é verdade tanto para o mercado financeiro como para as métricas operacionais das empresas. Focar unicamente no resultado desse trimestre ou do próximo nos deixa cegos às mudanças estruturais e duradouras dos próximos anos. Devemos nos planejar e ter uma visão de onde queremos estar nos próximos anos e trabalhar de acordo para chegar lá, sabendo que o caminho até o objetivo pode não ser linear.
      • Focus relentlessly and passionately on the customer: a Amazon desde o início pretendeu ser a empresa mais focada no consumidor do mundo. Mais importante do que focar nos concorrentes, como as demais empresas costumam fazer, a Amazon manteve seu foco nos clientes (customer obsession as opposed to competitor obsession), isso porque, nas palavras de Bezos, “customers are always beautifully, wonderfully dissatisfied, even when they report being happy and business is great”, exercendo uma constante pressão para a empresa melhorar.
      • Resist proxies: conforme as empresas vão ficando maiores e mais complexas, há uma tendência de se preocupar mais com os processos formais do que com o objetivo final que eles buscam alcançar. Um bom processo serve a um funcionário para que ele sirva a seu cliente final. Porém, se não tomarmos cuidado, o processo pode virar um fim em si mesmo. Você para de observar os resultados finais e se preocupa somente em seguir o processo correto. Em suas próprias palavras, “não é raro ouvir um líder defender um resultado ruim com algo como: “Bem, nós seguimos o processo.” Um líder mais experiente usará isso como uma oportunidade para investigar e melhorar o processo. O processo não é a coisa. Sempre vale a pena perguntar: “Somos nós os donos do processo ou o processo nos controla?”.
      • Decision making: algumas decisões possuem consequências profundas e são irretratáveis. Essas decisões devem ser feitas com muita calma, de forma analítica e metódica, com grande deliberação e consulta. Porém, a maioria das decisões não são irretratáveis, mas sim revogáveis. A beleza destas decisões é que elas podem ser feitas mesmo sem amplo consenso e amplo a acesso a todas as informações. 70% das informações já deveriam ser suficientes para tomá-las por indivíduos capazes. Acima disso, provavelmente está se perdendo tempo.

    Além de vários insights como esses, o livro traz uma narrativa leve e bem-humorada, característica de Bezos, e conta uma série de anedotas sobre a história da Amazon, desde o início, quando ainda sonhavam em ter dinheiro para comprar uma empilhadeira, até os dias atuais.

    Caso você seja um investidor experiente ou recém-iniciado, acreditamos que os livros acima trarão valiosas lições com uma boa dose de divertimento. Um agradecimento especial ao amigo Gustavo Baltar, que indicou algum dos livros desta resenha. Sem mais delongas, boa leitura!

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