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Estamos otimistas com o Brasil, mas corte de juros será lento, diz Barboza, da Ártica

Ao Bora Investir, sócio e gestor da Ártica diz que movimento de alta deve apenas colocar Ibovespa de volta à sua média histórica e será causado mais pela ausência de efeitos negativos do que por efeitos positivos

Ivan Barboza, sócio e gestor da Ártica. Foto: Divulgação
Ivan Barboza, sócio e gestor da Ártica. Foto: Divulgação

Após emendar 13 quedas consecutivas, o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores, a B3, encerrou o pregão de sexta-feira, 18/08, no azul. O movimento negativo teve início quando o índice estava acima dos 121 mil pontos. Mas mesmo com as baixas consecutivas nesse período, o Ibovespa ainda está longe da sua mínima do ano, que foi de 97 mil pontos, em março.

Para Ivan Barboza, sócio e gestor da Ártica, apesar de terem sido dias atípicos, o porcentual de queda foi baixo. Ele aponta que é difícil explicar movimentos curtos. “Essa volatilidade pode acontecer por diversas razões”. Apesar de confiante na recuperação da bolsa, ele aponta que o otimismo não deve ser extremo. “Há mais ausências de fatores negativos do que fatores positivos”.

O fundo de ações Ártica Long Term tem patrimônio de R$ 255 milhões e registra alta de 23% nos acumulado do ano, o equivalente a 280% do CDI. Sua rentabilidade total é de 96%. o resultado foi obtido entre sobe e desce: metade do tempo o fundo supera o CDI, e metade não. O fundo é destinado a investidores qualificados, e sua aplicação inicial mínimo é de R$ 20 mil.

Veja abaixo a entrevista completa do gestor ao Bora Investir:

Bora Investir – O que explica a queda de 13 dias do Ibovespa após o mercado de ações voltar ao radar da maioria dos gestores?

Ivan Barboza – Apesar de terem sido 13 dias de queda atípicos, o porcentual de queda for baixo. É difícil explicar um movimento curto. Ele pode acontecer pelas mais diversas razões, inclusive coisas que não estão relacionadas com a saúde da economia brasileira, como uma redução da alocação em mercados emergentes capitaneada por investidores estrangeiros.

Estamos otimistas com o Brasil, mas acreditamos que o corte de juros será lento e, portanto, não vamos ser confiantes ao extremo. Estamos caminhando para nos próximos anos melhorarmos em relação ao cenário em que estamos agora.

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Mas vale lembrar que estamos saindo de uma base baixa, causada por problemas atípicos. Especialmente por conta da pandemia, que atrapalhou as operações de muitas empresas, pois deixou muitos funcionários em casa e foi mais longa do que imaginamos. Esse período gerou um problema com a inflação, que foi um efeito rebote causado pelos governos, com o intuito de estancar os problemas na economia. A carrego veio também um ciclo de juros altos atípicos para combater o problema.

Agora com a inflação mais controlada, os juros começam a reduzir e há uma probabilidade de a bolsa recuperar, reverter o movimento a caminho de sua média histórica. Ou seja, não será algo excepcional. A bolsa ainda está barata, mas está saindo de uma base baixa. Portanto, para recuperar, não precisam acontecer fatores positivos, apenas deixar de ter fatores negativos que a puxam para baixo.

Existem fatores positivos, mas que ainda não colocamos na conta, pois seus impactos serão em prazos muito longos, na produtividade do país. A Reforma Tributária ainda não foi feita, mas a expectativa é que seja boa. Há um vento extra a favor.

Nossa expectativa é de que o corte de juros seja bastante lento, e dure dois anos. Ate por que a queda de juros costuma ser lenta. Para ter maior efeito sobre a economia essa queda precisará efetivamente acontecer. O início do ciclo mexe com a bolsa, mas não com os resultados das empresas. Precisamos de tempo para ver as empresas operando com os juros baixos. Somente dessa forma veremos um aquecimento do mercado de crédito e do varejo.

Bora Investir – O cenário no exterior pode atrapalhar um ciclo benéfico? O Fed disse que espera alta da inflação. E qual é a influência da desaceleração da China sobre o país?

Ivan Barboza – Acho difícil fazer afirmações sobre como o cenário macroeconômico pode impactar a bolsa. Se a solução para o problema da inflação está mais atrasada nos Estados Unidos e na Europa, pode nos colocar como um bom ambiente para investimento, já que já saímos desse ciclo. Mas muitos investidores podem preferir levar o dinheiro para os Estados Unidos não porque a economia brasileira está ruim, mas porque precisam do dinheiro por lá.

O desaquecimento da economia da China tem um lado ruim, pois o país asiático é um grande cliente do Brasil: exportamos muitas coisas para lá. Mas um movimento de mais longo prazo, com o objetivo de descentralizar cadeias de produção da China, poderia trazer programas de investimento para o Brasil, a exemplo de fábricas. Ou seja, é difícil saber se o saldo da crise chinesa será positivo ou negativo. No longo prazo, acredito que beneficie a economia brasileira.

Bora Investir – Neste cenário, o que o investidor deve considerar ao girar a carteira novamente para ativos de risco. É muito cedo para fazer esse giro?

Ivan Barboza – Atualmente nem tudo na bolsa está barato. Tem coisas caras na bolsa, e o investidor pode errar a mão e comprar coisas sobrevalorizadas. Precisa, portanto, separar o joio do trigo, saber o que está barato depois da subida e o que passou do ponto. Isso não é tão simples de fazer.

Eu entendo o raciocínio de que, se os juros estão bons, que o investidor mantenha parte da sua carteira em juros. Mas quanto mais os juros caírem, a bolsa tende a ir subindo. Portanto, dificilmente as ações estarão mais baratas quando o corte terminar.

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Além disso, quando o corte de juros começa, o mercado tende a subestimar o final do corte, que pode ser menor do que o esperado. Isso acontece por conta de um efeito de ancoragem, pois as previsões de juros futuro nunca são tão discrepantes do momento atual. Os economistas fazem uma projeção direcional, que está sujeita a um viés.

O combate à inflação é programado, mas é difícil prever o que vai acontecer no ambiente macroeconômico em períodos longos. E mais de um ano já é um período longo para a análise da macroeconomia.

Bora Investir – Muito se fala agora sobre small caps, que tendem a se beneficiar dos juros mais baixos. O que deve ser ponderado?

Ivan Barboza – Buscamos investir em empresas resilientes, com horizonte de 5 a 10 anos, que tenham uma boa posição no mercado, ao mesmo tempo que uma taxa de retorno atrativa. Não olhamos apenas o preço da ação, mas o lucro e capital investido na operação. Se a companhia é longeva, e capaz de investir, é uma boa empresa. Ela irá performar bem porque traz bons resultados, independente das intempéries do mercado.

Gostamos de empresas grandes e líquidas, mas também temos small caps na carteira, que são companhias que costumam ser desprezadas por fundos grandes. O desafio ´´e identificar as melhores e comprá-las por um preço atrativo. Se a empresa for excelente, mas você pagar caro por ela, ela deixa de ser interessante.

É em época de crises que mais compramos. O retorno do nosso fundo no ano passado foi ruim, mas fizemos muitas compras. Neste ano, ele já voltou a ficar no positivo. É menos perigoso comprar ações a preços baixos do que a preços altos. Nunca tudo dá errado em crise: essa é a nossa filosofia micro. Acreditamos que um médico excelente sempre terá uma renda razoável, não importa o cenário. A lógica de boas empresas vai nessa linha. Independentemente do ambiente macro, ela tende a sobreviver melhor do que a média.

Bora Investir – Como o fundo da Ártica vem navegando pelas crises?

Ivan Barboza – Acreditamos que não importa o horizonte dos investimentos, mas sim seu ponto de início e final. É difícil ter disciplina para entrar em uma posição que pode levar três anos para se provar correta. Mas teve tese nossa que demorou mais do que isso, depois estourou e se tornou muito rentável. Uma delas é Marcopolo, que de 2019 a 2022 andou de lado , mas neste ano se provou muito rentável.

Para que a tese dê certo, precisamos ser pacientes e fazer o dever de casa técnico, ter a visão de que um ciclo econômico médio demora cinco anos e meio. E, principalmente, ´pensar no longo prazo. Caso contrário, você ganha úlcera, mas não ganha dinheiro. O investidor, portanto, devia estar torcendo para a bolsa sair, e não subir, para comprar ações mais baratas.

Bora Investir – Apesar do efeito de longo prazo, o andamento das reformas pode pesar sobre os mercados?

Ivan Barboza – Não coloco esses efeitos na conta, porque a reforma mais impactante, que é a tributária, não está determinada ainda. Mas insiro como um elemento potencial de retorno extra. A reforma pode ser ou pouco relevante ou positiva, mas dificilmente prejudicará o mercado.

A reforma tributária tende a ser positiva para os setores que irá beneficiar. Mas outros serão prejudicados. O investidor precisa entender quem se dará bem e quem se dará mal. Estamos evitando investir em setores que possam registrar aumento de carga tributária. Existem setores que pagam pouco Imposto sobre a Receita (ISS), e como a proposta da reforma é uniformizar, podem ter uma sobrecarga. É o caso do setor de serviço, como o de locação de equipamentos.

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O investidor sempre tem de fazer um pouco de stock picking na bolsa. Existem setores indo muito bem, como commodities. Mas não é porque Vale e Petrobras estão em altas que a economia vai bem, e nem o inverso. Precisa ter cuidado onde entrar.

Investir em ações é um jogo de longo prazo. Não existe ninguém que tenha um histórico consistente de investimentos que seja capaz de acertar o tempo do mercado. Alguns acertam por alguns anos, mas depois perdem. Não existe ninguém que acerta todas ao longo de cinco décadas. Para quem não tem estudo, isso é menos difícil ainda. Ou você pensa no longo prazo ou se educa sobre a bolsa para fazer uma escolha minimamente instruída. É um jogo comandado por investidores profissionais.

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